A recessão, que começou com a chegada do novo coronavírus ao Brasil, ainda não deu sinais de ter acabado, apesar de o país ter tido crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) nos dois últimos trimestres de 2020.
Em junho de 2020, o Codace (Comitê de Datação de Ciclos Econômicos), órgão ligado ao FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) e formado por oito economistas de diversas instituições, definiu que o Brasil entrou em recessão no primeiro trimestre de 2020, encerrando um ciclo de fraco crescimento de três anos (2017-2019).
Além disso, o comitê fundamenta suas decisões na definição clássica do que é recessão -uma queda generalizada do nível de atividade- e olha para um conjunto grande de indicadores de atividade econômica, não só para o PIB.
Ele lembra que alguns setores não se recuperaram e ainda estão bem abaixo do nível de antes da recessão, principalmente os serviços, mas também alguns segmentos da indústria.
"Para caracterizar uma retomada não basta alguns poucos setores no curto prazo mostrarem crescimento. É como se a gente tivesse descido três degraus e subido dois. Subiu, mas não foi de forma suficientemente forte para considerar que você saiu de processo recessivo".
Picchetti cita ainda a perspectiva de grande parte dos economistas de uma nova queda do PIB neste primeiro trimestre e, eventualmente, até no segundo trimestre de 2021.
"Nada disso está claro ainda. O primeiro trimestre nem acabou, vai demorar para a gente conhecer todos os indicadores. Em resumo, existe uma incerteza muito grande para datar alguma coisa que seria o final da recessão com base só nesses resultados de 2020."
ANO PERDIDO
A economia brasileira pode terminar o ano de 2021 praticamente no mesmo patamar do final de 2020.
O FGV Ibre calcula que um crescimento de 3,6% em 2021 já seria obtido se o PIB ficasse estagnado por todos os quatro trimestres (o chamado carrego estatístico). A instituição projeta crescimento de 3,2%, ou seja, prevendo um segundo semestre com crescimento insuficiente para compensar a queda esperada no primeiro.
Também estima um desemprego que deve chegar a 16% e terminar o ano na média de 15,3%, dois pontos percentuais acima da média de 2020. Em 2022, continuaria acima do nível pré-pandemia, próximo de 14%.
Segundo a pesquisadora, a alegria com a recuperação vista no segundo semestre de 2020 durou pouco, pois a munição do governo em termos de capacidade de injetar dinheiro na economia acabou. Por isso, para obter uma recuperação mais rápida da economia seria necessário avançar na vacinação e ter uma melhora nos números da pandemia.
"É como se fosse um semestre perdido [o primeiro]. Você tem um contexto econômico muito fragilizado em alguns segmentos. A solução para a pandemia é a vacinação, e a gente está muito atrasado e com muita incerteza sobre quantas doses teremos."
Lisandra Barbero, economista da XP, afirma que o PIB do quarto trimestre mostrou números positivos generalizados, tanto pelo lado da demanda quanto pelo lado da oferta, e deixou um carrego estatístico de 3,6% para 2021.
"Embora positivos, acreditamos que os números de hoje dizem pouco sobre 2021. Diferente do segundo semestre do ano passado, a renda total do consumidor está diminuindo agora, e a dinâmica da Covid piorou substancialmente. Além disso, a volatilidade do mercado financeiro aumentou, com efeitos negativos nas condições financeiras."
Luciano Sobral, economista da NEO Investimentos, projeta crescimento de 2,8% para o ano e não vê o início de uma recuperação antes do último trimestre. Ele estima um desemprego chegando ao pico de quase 20% e terminando o ano perto de 18%.
"Um dos motivos pelos quais a gente prevê esse PIB relativamente baixo é que, se você olhar a massa de salários do ano passado, não melhora muito quando se coloca na conta a criação de empregos neste ano. E vão sair esses R$ 300 bilhões para entrar R$ 30 bilhões, R$ 40 bilhões [de auxílio emergencial]. É difícil ser otimista."
"Não precisa crescer muito para o PIB ser 4% em 2021, que é a nossa projeção. A gente vê um primeiro trimestre positivo, não vejo sinal de queda. Há vários indicadores apontando crescimento. A tendência é a economia continuar se expandindo. Parece que o risco é de ser melhor e não pior", afirma Barbosa.
"O mercado de trabalho está se recuperando. Não tem uma recuperação completa, mas já voltou a subir a quantidade de pessoas empregadas. A taxa de poupança foi muito elevada e isso ajuda a sustentar a economia também."
O banco projeta uma queda no desemprego de 14,7% no final de 2020 (dado dessazonalizado) para 14,2% no final deste ano.
Sobre as novas restrições causadas pela pandemia, ele afirma que as taxas de isolamento social caíram em janeiro e fevereiro, beneficiando o consumo de serviços, e que a reversão desse cenário em março já é levada em consideração na projeção para este trimestre. O risco, segundo ele, é uma permanência dessas restrições pelos próximos meses.
"A dinâmica da recuperação em 2021 está atrelada mais ao calendário de vacinação. O cenário sanitário é primordial", afirma Maynard. "Esse fluxo de renda poderia ajudar um pouco. Por isso até a gente ainda não fala em queda no segundo trimestre. A gente ainda contempla um primeiro semestre de lado."
"No nosso cenário, a volta do PIB ao nível pré-crise só no primeiro semestre de 2022", afirma.
SETORES
A repercussão do resultado do PIB entre representantes de vários setores também mostra as dúvidas sobre como será a recuperação em 2021.
"As reformas estruturais, administrativa e tributária, vão possibilitar dinamismo ao ambiente de negócios e, por consequência, estimular a retomada econômica. O Brasil pede uma agenda clara e propositiva. Na outra frente, passou da hora de planejarmos e executarmos a ampla vacinação de todos, com organização e boa comunicação", afirma Roriz Coelho.
"A conectividade deve estar no foco das políticas públicas para que os investimentos em telecomunicações continuem sendo uma alavanca para o crescimento", disse.